Thiago Lia Fook Meira Braga nasceu em Campina Grande-Pb e reside em João Pessoa onde é analista judiciário do TRE-Pb. Se considera, antes de tudo, um leitor, pensador e escritor em tempo integral. O poeta publicou "Poesia Natimorta e versos sobreviventes" e a antologia de contos "Antigamente era melhor".
das falsas aparências
a chuva
que ontem
caía
fininha como ela só
era como Paulo, o Gordo
quando com seu corpo pesado
ergue os braços, irado
e ri, indefinidamente...
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a chuva
que ontem
caía
fininha como ela só
era como Paulo, o Gordo
quando com seu corpo pesado
ergue os braços, irado
e ri, indefinidamente...
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esfinge
eu sempre esperei
que as tardes de sábado
rasgassem o véu
do mistério
e os ventos que chegam
de trópicos baixos
soprassem verdades
no ouvido
joelhos curvei
venerei
os ralos do oeste
e os braços ergui
estendi
as pontas dos dedos
fingindo tocar
as portas do Éden
um dia escutei
uma voz
prometia
encher as lacunas
mas quando virei
o meu rosto
o que vi
foi só do meu corpo uma sombra
então decidi aceitar
que a Terra dá voltas calada
e que só se colhe do ar
coriza ou dor na garganta
porém continuei a adorar
as tardes de sábado
aqui da varanda
até que um dia
dormia? pirava?
o vento soprou-me no ouvido
palavras em língua estrangeira
seguiu o seu curso com pressa
e dentro da minha cabeça
largou a sentença
o enigma
que gira em concêntricos círculos
prometendo
vou devorar-te
não me decifras
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filosofia
eram três os cachorros vadios
que iam e vinham
birutas
latiam sem causa
os rebeldes
sem casa
metiam o focinho na rua
cadela
não tinham à vista
ou mesmo por trás de algum muro cruzeta
comida
catavam no lixo
que as casas cagavam azul nas esquinas
abrigo
faziam de conta
no seio das sombras de matos baldios
as portas se abriam
cresciam antenas nos bichos
as rodas giravam
vibravam tendões nos cambitos
as solas sumiam
se viam as patas dormindo
feirantes, carteiros, garis, medidores
e intrusos de todos os gêneros
pagavam as taxas em carnes e ossos
ciclistas, turistas, casais, corredores
e desavisados da espécie
botavam as pernas e os bofes na esteira
assim se passaram semanas e meses
e os cães coroados
dois pares de cetro
cravados nas bocas
reinavam sem cortes, jornais ou conselhos
primeiro quem fez foi o moço do 30
sentou-se sem medo no fio da calçada
serviu a ração de primeira em tigelas
dispôs em cumbucas de inox tantas águas
que não demorou a colher três mordidas
depois quem tentou foi a velha do 80
sortiu uma cesta com as frutas mais finas
ornou as treliças com os laços mais lindos
por cima enxaguantes e brancas bolinhas
mas não conseguiu mais que a raiva gosmenta
então os vizinhos uniram suas forças
e armados de pedras, machados, porretes
partiram pro tudo ou nada com as feras
as feras rosnaram, sacaram os dentes
partiram pro ataque
os flancos expostos
levaram furadas no dorso e no ventre
tombaram arfantes
e em poucos instantes
ficaram mais duros que as sujas sarjetas
mulheres e homens, crianças e velhos
ufaram, urraram, untaram os peitos
marcharam na rua em triunfo romano
serviram os cães para abutres distantes
dançaram, beberam, fizeram fogueiras
após uma noite de sono pesado
despertaram
e como se nada tivesse ocorrido
seguiram o curso das coisas humanas
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soneto ébrio
eu trago na caixola um carro velho
que volta e meia pega só no tranco
e roda quando muito trinta metros
só pra tomar tenência no mecânico
não sei se já é tempo de vendê-lo
e ver se dou com um de mais tutano
ou se parece mas não é defeito
a marcha não querer sair do canto
alguém me disse que isso é uma fase
que chega como a lua em pleno dia
e passa igual ao sol às seis da tarde
só sei que o carro bebe muita pinga
e quando bem chutado fala frases
que vão além do timbre da buzina
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soneto do amor descoberto
eu sempre soube que seria bom
amar tal como amaram muitos mitos
descer ao quinto dos infernos e os
vencer mais forte pois de lá voltando
tornar melhor o vil caráter ao
somente ouvir da voz sutis suspiros
fazer dos rudes traços troços lindos
com só um casto beijo lhes tocando
o que eu não soube e só vim descobrir
depois que o amor se apresentou a mim
e desgostoso foi-se embora irado
é que eu não sei amar tal como um mito
e sendo em carne e osso feito minto
se faço amor em vez de frango assado
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