Ariano Suassuna (1927- 2014) nasceu na cidade de Parahyba do Norte, hoje João Pessoa e foi um escritor brasileiro. Foi poeta, romancista, ensaísta, dramaturgo, professor e advogado. Em 1989, foi eleito para a cadeira n.º 32 da Academia Brasileira de Letras. Em 1993, foi eleito para a cadeira n.º 18 da Academia Pernambucana de Letra e em 2000, ocupou a cadeira n.º 35 da Academia Paraibana de Letras.Ariano Suassuna (1927- 2014) foi um escritor brasileiro. "O Auto da Compadecida", sua obra-prima, foi adaptada para a televisão e para o cinema. Sua obra reúne, além da capacidade imaginativa, seus conhecimentos sobre o folclore nordestino.
A infância
Sem lei nem Rei, me vi
arremessado
bem menino a um Planalto pedregoso.
Cambaleando, cego, ao Sol do Acaso,
vi o mundo rugir. Tigre maldoso.
O cantar do Sertão, Rifle
apontado,
vinha malhar seu Corpo furioso.
Era o Canto demente, sufocado,
rugido nos Caminhos sem repouso.
E veio o Sonho: e foi
despedaçado!
E veio o Sangue: o marco iluminado,
a luta extraviada e a minha grei!
Tudo apontava o Sol! Fiquei
embaixo,
na Cadeia que estive e em que me acho,
a Sonhar e a cantar, sem lei nem Rei!
*****
Nascimento - O exílio
Aqui, o Corvo azul da Suspeição
Apodrece nas Frutas violetas,
E a Febre escusa, a Rosa da infecção,
Canta aos Tigres de verde e malhas pretas.
Lá, no pelo de cobre do Alazão,
O Bilro de ouro fia a Lã vermelha.
Um Pio de metal é o Gavião
E suave é o focinho das Ovelhas.
Aqui, o Lodo mancha o Gato
Pardo:
A Lua esverdeada sai do Mangue
E apodrece, no medo, o Desbarato.
Lá, é fogo e limalha a Estrela
esparsa:
O Sol da morte luz no sol do Sangue,
Mas cresce a Solidão e sonha a Garça.
*****
A morte - O sol do terrível
Mas eu enfrentarei o Sol divino,
o Olhar sagrado em que a Pantera arde.
Saberei porque a teia do Destino
não houve quem cortasse ou desatasse.
Não serei orgulhoso nem covarde,
que o sangue se rebela ao som do Sino.
Verei o Jaguapardo e a luz da Tarde,
Pedra do Sonho e cetro do Divino.
Ela virá - Mulher - aflando as
asas,
com o mosto da Romã, o sono, a Casa,
e há de sagrar-me a vista o Gavião.
Mas sei, também, que só assim
verei
a coroa da Chama e Deus, meu Rei,
assentado em seu trono do Sertão.
*****
A mulher e o reino
Com tema do Barroco brasileiro
Ó! Romã do pomar, relva
esmeralda
olhos de ouro e azul, minha Alazã!
Ária em forma de Sol, fruto de prata
meu chão, meu anel, Céu da manhã!
Ó meu sono, meu sangue, dom,
coragem,
Água das pedras, rosa e belvedere!
Meu candeeiro aceso da Miragem,
Meu mito e meu poder - minha Mulher!
Diz-se que tudo passa e o Tempo
duro
tudo esfarela: o Sangue há de morrer!
Mas quando a luz me diz que esse Ouro puro
se acaba por finar e corromper,
Meu sangue ferve contra a vão Razão
E pulsa seu amor na escuridão!
*****
Aqui morava um rei
Aqui morava um rei quando eu
menino
Vestia ouro e castanho no gibão,
Pedra da Sorte sobre meu Destino,
Pulsava junto ao meu, seu coração.
Para mim, o seu cantar era Divino,
Quando ao som da viola e do bordão,
Cantava com voz rouca, o Desatino,
O Sangue, o riso e as mortes do Sertão.
Mas mataram meu pai. Desde esse dia
Eu me vi, como cego sem meu guia
Que se foi para o Sol, transfigurado.
Sua efígie me queima. Eu sou a presa.
Ele, a brasa que impele ao Fogo acesa
Espada de Ouro em pasto ensanguentado.
*****
O mundo do sertão
Diante de mim, as malhas
amarelas
do mundo, Onça castanha e destemida.
No campo rubro, a Asma azul da vida
à cruz do Azul, o Mal se desmantela.
Mas a Prata sem sol destas
moedas
perturba a Cruz e as Rosas mal perdidas;
e a Marca negra esquerda inesquecida
corta a Prata das folhas e fivelas.
E enquanto o Fogo clama a Pedra
rija,
que até o fim, serei desnorteado,
que até no Pardo o cego desespera,
o Cavalo castanho, na cornija,
tenha alçar-se, nas asas, ao Sagrado,
ladrando entre as Esfinges e a Pantera.
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