Orlando Tejo (1935-2018) nasceu em Campina Grande-Pb. Poeta, advogado, ensaísta, jornalista, folclorista e professor. De sua autoria: Conceição 63; Impasse; Soneto dos dedos que falam, e Zé Limeira: O poeta do absurdo.
Soneto Dos
dedos que falam
Que importa
que foguetes cruzem marte
E bombas de
hidrogênio acabem tudo,
Se aos meus
dedos, teus dedos de veludo
Ensinam que
o amor é também arte?
Não desejo
mais nada além de amar-te
E em êxtase
viver, absorto e mudo,
Sorvendo da
ternura o conteúdo
Que antes
te buscava em toda parte!
Esses dedos
que afago entre meus dedos,
Que
acaricio a desvendar segredos
De amor
nestes momentos que nos prendem,
Têm
qualquer coisa que escraviza e doma,
Porque teus
dedos falam num idioma
Que só
mesmo meus dedos compreendem!
*****
Conceição
63
Rua da
conceição, sessenta e três
(a artéria
tem o ar de um cais comprido)
aqui, anos
sem fim tenho vivido
buscando a
infância azul que se desfez.
Talvez seja
isso um sonho, mas talvez
este meu
velho abrigo tenha sido
da mesma
argila minha construído,
porque é a
mesma a nossa palidez!
Ele a mim
se assemelha: é ermo e trist.
No jardim,
no quintal, no chão, no teto
em tudo a
mesma semelhança existe.
No tempo,
entanto, aos céleres arrancos,
o seu
telhado vai ficando preto
e os meus
cabelos vão ficando brancos
*****
Impasse
Se ficar
onde estou não faço nada,
Se sair por
aí corro perigo,
Se me calo
minhalma é sufocada,
Se disser o
que sei faço inimigo...
Se pensar
vou trair a madrugada
E se sonho
demais vem o castigo,
Se quiser
subo até o fim de escada,
Mas precisa
brigar, e eu não brigo!
Se cantar
atropelo o contracanto,
Se não
canto maltrato o coração,
Se me faço
sofrer me desencanto,
Se reprimo
o ideal perco a razão,
Se perder a
razão, resta-me o pranto
E meu
pranto não faz uma canção.
*****
Conceição 63
Rua da conceição, sessenta e três
(a artéria tem o ar de um cais comprido)
aqui, anos sem fim tenho vivido
buscando a infância azul que se desfez.
Talvez seja isso um sonho, mas talvez
este meu velho abrigo tenha sido
da mesma argila minha construído,
porque é a mesma a nossa palidez
Ele a mim se assemelha: é ermo e triste.
no jardim, no quintal, no chão, no teto
em tudo a mesma semelhança existe.
No tempo, entanto, aos céleres arrancos,
o seu telhado vai ficando preto
e os meus cabelos vão ficando brancos.
*****
“NÃO AGUENTO MAIS”
Eu saí da Paraíba,
Minha terra tão brejeira,
Pra fazer publicidade
Na Veneza Brasileira
Onde a comunicação
É toda em língua estrangeira.
É uma ingrizia só
O jeito de se falar
O que a gente não compreende,
Passa o tempo a perguntar
E assim como é que eu vou
Poder me comunicar?
É bastante abrir-se a boca
O “inglês” fala no centro,
Nessa Torre de Babel
Eu morro e não me concentro
Até parece que estamos
De Nova Iorque pra dentro!
Lá naquele fim de mundo
Esse negócio tem vez
Porque quem vive por lá
O jeito é falar inglês,
Mas, se estamos no Brasil
Tem que falar Português!
Por que complicar a guerra
Em vez de se esclarecer?
E se “folder” é um folheto
Por que assim não dizer?
Pois quem me pedir um “folder”
Eu vou mandar se folder.
Roteiro é “story board”
Nesse vaivém estrangeiro,
Parece até palavrão
Que se evita o tempo inteiro
Porque seus filhos das putas,
A gente não diz roteiro?
Estão todos precisando
Dos cuidados do Pinel
Será feia a nossa língua?
É chato nosso papel?
Por que esse tal de “out door”
Substituir painel?
É desrespeito à memória
De Camões que foi purista
Esse massacre ao vernáculo
Não aguenta o repentista
Pois chamam “lay out-man”
O homem que é desenhista!
Matuto da Paraíba,
Aqui juro que não fico,
Onde até se tem vergonha
De um idioma tão rico
Por que chamar de “free-lancer”
Um sujeito que faz bico?
Publicidade de rádio
Apelidaram de “spot”
E tem outras besteiradas
Que não cabem num pacote.
Acho que acabou o tempo
De acabar esse fricote!
Por exemplo: “body type”
“Midia”, ”top”, “merchandising”,
“Checking list”, “past up”
(Que se diga de passagem)
“Briffing”,“Top”, “Marketing”,
Tudo isso é viadagem!
Já é hora de parar
com esse festival grosso
Para que o nosso idioma
Saia do fundo do poço.
Pra isso eu faço esse “raff”,
Isto é, perdão, esboço!
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