domingo, 9 de abril de 2023

Jomar Moraes Souto

 Jomar Moraes Souto nasceu em Santa Luzia do Sabugi-Pb. Escreveu o clássico Itinerário Lírico da Cidade de João Pessoa, Agrarianas e outros poemas escolhidos. Possui uma vasta fortuna crítica. Formado em Ciências Jurídicas pela Faculdade de Recife.





 

Festa Nordestina
 
As mesas estavam postas
no meio da rua,
e as brasas dispostas
na pedra nua.
 
Eram as camponesas,
na tarde sua,
límpidas tristezas
no meio da rua.
 
E eu me lembro de que havia
ainda
um fogareiro aceso.
Sobre o trempe u’a mão tremia,
assando milho, com medo.
As mesas estavam postas
no meio da rua.




*****

 


ELEGIA PARA OS SAPATOS AO SOL
               
                 I

Molhados. Estão molhados.

Deixo-os, pois, secar ao sol,

São sapatos fazem jus

a um canto dentro da luz

derramada pelo sol.

 

Eles são sapatos, hoje.

Mas, ontem, foram bois mansos.

Tiveram amplos currais

e pastagens e arrebol.

Antes, levavam os carros.

Levam, hoje, os pés dos homens

da sombra triste para o sol.

 

Eles são sapatos, hoje.

Mas, ontem, foram bois mansos.

E escutaram os tristes cantos

dos vaqueiros pelos campos

cantando de sol a sol

 

 

 II

 

Só  depois dos estilhaços

e dos seixos dos caminhos,

viram-se em frente da morte,

no matadouro, sozinhos

 

E o sangue que antes jorrava

só na ponta do ferrão,

desceu ao ventre da terra

em rubras poças, no chão.

 

Tiveram o couro suspenso

na noite de algum curtume,

entre as carícias do vento

e os beijos de um vaga-lume.

(Eram, antes, bois de carro

- um par autêntico e manso.

Mereciam, pois, na morte,

um momento de descanso).

 

 III

 

Eles são sapatos, hoje.

Mas, ontem, foram bois mansos.

Muito antes do curtume,

do operário e do formol,

e dos rastros nas areias

caminhos de algum farol.

 

Por isso eu abro a janela

e deixo-os secar ao sol.

 

- Um minuto de silêncio!

Não ria nem chore, pois

esses, hoje, assim, sapatos,

um dia já foram bois.

Perderam somente o sexo.

Continuam sendo dois.




*****




SONETO PARA UMA NOIVA

 

De casca de laranja os amarelos

tingindo o seu vestido e escondendo-a

no laranjal distante. Paralelos

os passos vão nos sumos. Uma amêndoa


não, duas amêndoas, sim, seus olhos belos

movendo-se nos longes, ou movendo-os

no verso as minhas mãos que apenas tê-los

quisessem por amparo, incandescendo-os


no frio de uma tarde, quando a chuva

nem me deixasse vê-la inalcançada

(quase perdido o vulto na paisagem


real) sem sombrear mais minha dúvida

de amêndoas, de olhos, nem de nada,

nem mesmo de outro fruto na folhagem. 



*****

 

 

 

SONETO SÓ PARA A SEGUNDA PESSOA

 

A de ti de quem não sabe a dor do vento

ninando a tarde verde no aqueduto.

A ti que mais amar na noite intento,

tangendo este silêncio em ti escuto


insto que em tí, por nós, no mesmo acento,

liberto e rendo, só por ter-te em tudo

de onde tirar, na flor em que te invento,

essa outra flor do amor que te disputo.

 

Não só por flutuares, ou que mais

longe um do outro, não nos fiquem bens.

Mas é porque sabendo que te vais,

 

Eu sei, também, do verde em que te vens

ungida e alegre para nunca mais

arderes, só, no adeus em que me tens. 

 

 

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