domingo, 12 de março de 2023

Violeta Formiga

Violeta de Lourdes Gonçalves Formiga nasceu em Pombal e morreu em João Pessoa em 1982. Um caso clássico de feminicídio. Foi poeta e psicóloga formada pela Universidade Federal da Paraíba. Publicava seus poemas no Jornal A União e especialmente no suplemento Correio das artes. Publicou dois livros de poemas. “Viver é amar a vida sem definições. Viver é desabrigar os demônios e conviver com os Deuses”. (Violeta Formiga).

 


 

 

 

AFETIVIDADE


Sou.
Estou.
Indefinidamente
vou.

 

*

 

VIVÊNCIA


Faço poema
como quem faz
pão:
faminta e necessária.

 

*

 

DO LADO ESQUERDO

Sou o sentido contrário
das coisas cálidas,
pálidas,
serenas.

O deserto,
o incerto,
o incesto,
a cena.

 

 *

 

NASCIMENTO


Saio de mim mesma
como pássaro
do ovo.

De espaço e asas
faço meu aprendizado,

Mágico voo.

 

 *

 

O TEMPO

O tempo
passa como o vento
com as estações
passado-presente.

O tempo
desconhece as cores
incolores do silêncio.

O tempo
segue sem trilhas
as linhas infinitas
do momento.

 

*

 

AFIRMAÇÃO


A poesia
nasce do dia.
Não deixe que eu morra,
me sinta.
É assim que eu sou
alegre e triste,
eterna e não efêmera,
amante do belo
e da miséria, companheira.
Não me evite,
me tenha
mesmo guardada em segredos
ou exposta ao sol
e ao vento.
Não tenho tempo fixo,
nem infância, nem velhice
e me faço sempre presente
onde a vida insiste
e resiste
persistente.

 

*

 

GAVETAS

 

Ficou detido
no armário
um beijo.

Era cedo.
Igual ao frio
que na madrugada
chega.

Até então
eu pouco sabia
de confissões
e medo.

 

*

 

ROMANTISMO

 

Vida
faço e sou feita
de sentidos.

Bebo vinho
escuto uma sonata
e me abrigo


numa grande noite
de um mundo
antigo.

 

*

 

DEDICATÓRIA

 

Acasalada
feito pássaro
deixa-me voar
desfeita.





MAGIA


Construir no teu corpo
meu castelo,
fortaleza de árvores,
pontes e anúncios,
provar o fruto maduro,
transformar dores em flores
silvestres
e o dia amanhece.
(universalmente amanhece)
sentir o orvalho,
aroma
de tudo que apodrece
atrás do muro,
dentro da lama,
onde a vida se revela
sem mistérios.
E entre o muro
e o castelo,
teu corpo dança nas estrelas,
dança na fogueira
a dança dos deuses
e demônios.
Eu tento atravessar
a corda,
abrir a porta,
mas sobre o deserto,
o gesto
permanece mudo.

 

*

 

INFÂNCIA

Como se ontem
fosse
sentados juntos
na areia.

Éramos suficientes.

 

*

 

SUBJETIVIDADE

 

As cores do outono,
as flores da primavera,
o encontro com a chuva,
o vento.

O silêncio das madrugadas.
O silêncio do silêncio,
o silêncio da vida,
silêncio.

 

*

 

ESSÊNCIA

 

Procuro
o cerne,
encontro
o verme.

será ela?

 

*

 

RECADO

 

Quantas luas
se passaram
dentro do quarto,
no anonimato,
no outro lado
do asfalto
onde minhas mãos
procuram
extrair das tuas
o permitido
afago.



 

PRIMAVERA

Partida ao meio
entre deuses
e demônios,
me concebo.


*


INTEIRA


Minha vida
por uma única
palavra:

liberdade.

(Então eu
serei feliz
como os anjos
que ainda não
nasceram).

 

*

 

SENSAÇÕES

É simples.
Não me aproximo.
Tenho medo.
Você não compreende
como o deserto
cresce.
Você não entende
o desejo latente
contido em cada
gesto.
Da solidão,
sensações.
(Se você soubesse).

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