segunda-feira, 6 de março de 2023

Maxwell Dantas

Maxwell Fernandes Dantas nasceu no Alto Sertão, em Sousa-Pb e vive no Cariri, em Boqueirão-Pb. É poeta, cronista, professor e membro da Associação Boqueirãoense de Escritoras e Escritores – ABES. Publica suas “Crônicas Felinas” no seu pergil do Instagram @maxwell.f.dantas e possui poemas e contos publicados em coletâneas como “O despertar da cultura" (EDUEPb, 2008), “A interculturalidade em ação:aportações literário-culturais e linguístico-metodológicas” (Ideia 2010), Boqueirão: História, Cultura e Identidade" (2021) e Novos poetas do Cariri paraibano (2010) e na revista Blecaute.



 

Sinfonia dos túneis escuros

 

O poeta sentou-se à frente do computador

Posicionou os dedos de forma a precipitar chuva

e começou a reger a orquestra

tocando conflitos em engenhos de frases sem conforto

fazendo tremular as zonas erógenas imateriais

 

Os dedos... ali agora não os tem

é com fome e sede que vem esculpindo em transe sua sinfonia

 

Pôs nela o vento, o medo,  e um passo galhardo

para dar nuances às notas agudas

 

O olhar vago para o horizonte está afinado com notas de violino em piano

 

A solista estremece as lembranças de todos com voz de futuro anunciado

 

O solista excreta os transtornos com timbre preciso e longo

 

A música inunda o recinto com a sinergia do agora inevitável

 

As teclas no teclado qual pistões em frêmito

tornando a música quase tangível

             QUASE TANGÍVEL

 

Entrelaçando-se em espiral

a ruga serena

e a náusea emocional

num turbilhão silencioso de trovão

envolvem a consciência dos ouvintes que escutam com olhos atentos

a sinfonia

fluindo impassível

e prestidigitando

um clima cinza e terno

como a umidade de inverno

 

palavras serpenteiam pelos corredores da mente

e adentram os túneis escuros de todos

revolvendo o pó do intemperismo da infância

 

então

O som cessa afinal:

 

consciências molhadas

ouvidos nutridos

almas lavadas

e caminhos primevos

retraçados

        por sons magistrais orquestrando

        gotas aladas

        [escritas caladas]

        que voam em bando

  

 


 

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Claro, claro, claro

Escuro

Busquei tanto algum amparo

No improvável desse furo

 

Claro, claro, claro

Muro

A luz me serve agora

quando o sol já vai maduro

 

Claro em todo o músculo

Claro sopro forte

Ainda que a sorte

trace um corte no escuro

 

Miro nesse corte

Mas o alvo é o futuro

 

 

 

 


O verde e o cinza

 

 

Quando vou de Boqueirão à Campina

E a bandeira verde e cinza da paisagem

Me confunde entre o sol e a neblina

E germina ficção nessa mensagem

 

Penso na permuta natural das cores

Na divisão injusta dos matizes

No pouco tempo reservado às flores

E o longo tempo da sede das raízes

 

Cinza, tom que predomina na janela

Um quadro em movimento que ressalta

A imagem que veloz se modela

Na parte do ano que o verde faz falta

 

Da janela do carro sempre olho

Esperando o verde inverno que demora

Quando chega em pouco tempo vai embora

E o cinza retoma o monopólio

 

É do verde forte e vasto qu'eu gosto

Miríades de folhas que se espalham

É nessa imagem bela que me encosto

E o cinza traz as imagens que falham

 

Ver o cinza e lembrar do verde é loucura ?

 

Será que tem cura

 o verde sobrepor-se ao cinza pela beleza pura ?

             Ou

             Beleza só é plena quando a imaginação concatena

             os tons de cinza e verde em sons

             de inevitável costura

             que a natureza ordena com destreza

             de holística mistura  ?

     em estado de sistema

             que se auto regula ?

Orquestra sem maestro

conexão que dissimula

a inerente dependência

do verde pelo cinza

do cinza pelo verde

 

                       Vós vedes os verdes campos acinzentados no verão

                       com espírito de oposição

                       e vedes no inverno a distância do inferno

                       de calor e sequidão

 

                       Enquanto a Orquestra natural dá os tons de relação fraternal

                       do cinza e do verde

                       Pois sem motivo moral, altivo ou docente

                       quis sem querer

                       É sem ser

                       em seu tom silente

 

Pois todo sistema conjuga sem problema

em condições vitais

a plenitude da perfeição com os efeitos colaterais

 

E a Orquestra natural segue

Sem parar nem falhar

concatenando os sons

organizando os tons

à revelia do nosso olhar

 

O Punho e o Sol

 

 Homem que tira leite de pedra                                
Trincando os dentes, de mão rachada

Garante que o sol não quebra

Ao som estridente da enxada

A força do punho tenaz

 

Imponente feitor seca a folha e a face

Queima o solo e a esperança

Ilumina a terra quando nasce

E o olhar que longe lança

Mas não torna o punho incapaz

 

O brilho do sol no leste

Que cedo desponta da serra

De igual beleza no oeste

Quando à tarde o dia encerra

Não muda o que o punho faz

 

Desde criança essa luta

Trabalha, casa e tem filho

Untando o sol com a labuta

Plantando feijão e milho

O punho do homem não jaz

 

Quando o sol, distraído, vacila

E a chuva o trabalho compensa

O solo antes roto cintila

Mas o homem vivido já pensa

Baixar o punho jamais

 

Sereno e cansado no olhar

Nas mãos vê os calos que fez

Sem saber o que vai encontrar

Vê o sol pela última vez

O punho descansa em paz

 

 


 

 

As vestes da dama

 

À morte o guerreiro que sucumbe à espada                        

e guarda em seu peito a derrota e a honra

Há morte no campo de batalha

onde jaz o homem de guerra que por sua aldeia lutara

Eu, mórbida dama primitiva visto armadura

com lâmina em punho

 

À morte aquele cujo amor não lhe foi facultado

Pela amada inatingível

Há morte no olhar voluptuoso do jovem amante

que se joga do abismo em busca de alívio

Eu, mórbida dama visto o manto vermelho

do amor e da paixão

 

À morte todo aquele ou aquela que espirra, compra,

anda, dorme e respira

Há morte no pai, no filho e no espírito santo

na escola e no congresso

Eu, mórbida dama visto o colorido abadá

do fato social

 

 

 

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