Jennifer Trajano nasceu em João Pessoa(Pb) e é formada em Letras (UFPB). Publicou Latíbulos e Diga aos brancos que não vou. Participou das antologias Um girassol nos teus cabelos: poemas para Marielle Franco e Cult Antologia Poética 3: poemas para fazer o luto desse tempo.
paixão
a asa se viu
pousada no costume
de ser mirada pelo caçador
quando a ameaça
se aproximava
penava, mas não voava mais
sereno envelhece
no branco que fazia
genocídio de xamã
com finos versículos
gerando ira em tupã
girando a mira
na fé de si
tira a tirania
que atira sangue
e vermelha o
verde da bandeira
esse símbolo
que nem é daqui
pátria
pela manhã vovó
mandava mainha
cozinhar congeladas
estrelas celestes
e as constelações
faziam brilhar
o fervor nas panelas
um dia nero visitou nosso céu
em tempo de cana com mel
e não havia ave
dormindo na
cadeira de balanço
ou vela de sétimo dia
para o gato da parede
então a comida queimou
os corpos ficaram
por dobrar os panos
e enterrado no quintal
o ventre da casa
que nunca foi nossa
perdeu o bebê
consciência
acordei olhando
os olhos de vovó
e debulhei as marcas
da escavada velhice
cravada na pele
vi ali os restos
das vendas
nas fendas
das pretas
maltratadas
acordei com as vozes
negras espancadas, veio
na veia a velha vontade
de remar, queimar
os barcos no mar
acordei olhando
os raios solares
baterem à porta
da catarata de vovó
inundei de coragem
ela na cicatriz faz nó
em ancoragem
tira o véu
olha pro céu
dentro do sol
e me acorda dizendo
nalgum lugar, lá onde
sempre estive, a carne
mais barata
do mercado
não é a carne
negra
nebulosa
A Sérgio de Castro Pinto
do olhar de baixo:
voa o papagaio
com o olho
cabisbaixo
ao voo, em dis-
tante raio, feito
flecha ao vento
sem tempo
, demora
contando
as brechas
do céu, a cor
da hora
e ao lado
de fora
faz eco como
quem ecoa
estrelas
pedindo
falas, indo
nebulá-las
quereria não
partir as asas
não compensa
repetir palavras
sem entendê-las
só por assim
dizerem sê-las
do olhar de cima:
lá do azul
que não sai
águia o vê e voa
guiada. já sem rima
a guia vê-se
no olhar torto
enfim vai-se um bi-
cho dentro do outro
regresso ao ventre e
ao osso, donde restos
de estrelas lembram
ao fim que nada, nada
é tão livre assim
Nenhum comentário:
Postar um comentário