Pereira
da Silva (Antônio Joaquim Pereira da Silva), jornalista e poeta, nasceu em
Araruna, Serra da Borborema, PB, em 9 de novembro de 1876, e faleceu no Rio de
Janeiro, RJ, em 11 de janeiro de 1944. Quinto ocupante da Cadeira 18 da
Academia Brasileira de Letras. Começou sua carreira
como crítico literário nos jornais A Cidade do Rio (de José do Patrocínio, onde usou o pseudônimo J.
d’Além), Gazeta de
Notícias, Época e Jornal do Comércio. Participou do grupo simbolista que publicou a revista Rosa-Cruz, que tinha à frente Félix Pacheco, Saturnino de Meireles,
Paulo Araújo e Castro Meneses. Tornou-se um destacado poeta do movimento, de
1903 a 1905. Voe Publicou os livros Solis (1903); Solitudes (1918) - Em
apêndice, o estudo Solitudes, de Luís Murat; Beatitudes (1919); Holocausto
(1921) - Em apêndice, estudo de Agripino Grieco a propósito do livro
Beatitudes; O pó das sandálias (1923); Senhora da melancolia (1928); Alta noite
(1940); Poemas amazônicos (1958).
A CONSCIÊNCIA
Noite...
sombras... silêncio... indefinida
Angústia imponderável pelo ambiente.
Penso, em meu leito, como um ser consciente:
- "Mais um dia de menos para a vida..."-
Como
os dias passados - o presente.
Idéias vãs; desesperada lida;
Esforço inútil; alma incompreendida
Em tudo quanto crê ou quanto sente;
A
juventude quase no seu termo;
Mente mais débil; corpo mais enfermo,
A nobre fé de antanho menos forte...
Que
horror! A consciência, como a aranha,
Tais razões urde e nelas se emaranha
Que só fica a razão final da morte!
*****
INTERIOR
Ocaso.
Em minha sala quase escura
Olho os retratos. Dante está presente:
- Face entanguida, olhar impenitente,
Boca num forte ríctus de amargura.
Em
Poe, que o sol, num claro, transfigura
Baudelaire crava o olhar. E frente a frente
Fitam-se longa, misteriosamente,
Tal como o Tédio diante da Loucura...
Em
torno e em tudo erra um silêncio absorto.
Sombra do gênio? Alma do desconforto?
Forma do ser disperso no Nirvana?
Quem
saberá jamais? A noite desce.
Cada efígie daquelas como cresce
E assombra mais minha tristeza humana!
*****
A DOENÇA DA VIDA
Corri
toda a cidade, noite adiante:
Ruas e praças, becos e vielas,
As avenidas amplas, largas, belas,
Sob o vivo esplendor da luz radiante.
Vi-lhe
os bairros de lôbregas mazelas;
Os palácios, o nobre orgulho arfante
Dos seus salões, tudo como um passante
Curioso de quadros e de telas...
Oh!
a tristeza ardente, comovida,
Dos que vivem na muda indiferença
De uma ruidosa Acrópole incendida!
Oh!
a tristeza amarga de quem pensa!
O Tédio, o Spleen, o Ideal, doença da Vida,
Poe, Baudelaire, Leopardi, vossa doença.
*****
SÍSIFO
Incessante
labor! Quase sem mais entranha,
Inane da exaustão da mesma insonte lida,
Causa, Sísifo, horror à mais empedernida
Alma que o vê na afã de punição tamanha.
Pés
e mãos a sangrar; pávido suor que lhe banha
A extrema lividez da máscara estarrida.
- É o pavor de escalar ainda e sempre a montanha
Entre mil decepções já subida e descida.
Tantas
vezes em vão conduz a pedra a medo
Quantas a vê rolar da colimada altura
Sobre o talude hostil daquele monte quedo...
Como
a Sísifo entende alguém que se procura
E na mesma expiação do galé do rochedo
Rola seu próprio ser como uma dor obscura!
*****
DIÁLOGO ÍNTIMO
Vamos!
Desperta dessa indiferença
E olha a Cidade! Que beleza imensa
A
moderna Cidade soberana!
É justo o orgulho de que bem se ufana
O
homem do grande século do Invento!
Por toda parte a indústria e o movimento
Às
ruas dão estranha alacridade.
Não há fadiga nesta nova Idade
Da
Energia, da Força, da Riqueza.
Em cada olhar humano brilha acesa
A
ambição de vencer o Tempo e o Espaço.
Corre-se e voa quase sem cansaço.
No
céu, no mar, na terra, em toda parte
O homem da nova técnica e nova arte
Tudo
transporta e tudo movimenta.
Uma estética inédita e violenta
Imprime
à vida nova encanto novo.
Que festivo rumor na alma do povo!
Vê-se
que há nesta humana efervescência
A verdadeira idéia de existência
Como
a vemos em atos definida:
"Fazer do instinto a fórmula da vida."
A
Glória nada é mais que uma atitude;
O Belo, um gesto; a Força, uma virtude;
As
Idéias onímodos motores.
Os verdadeiros homens superiores
São,
como vês, o desta Vida Intensa
Que tanto ri do espírito que pensa
E
vai no mais estranho automatismo
Rolando e rindo para um novo abismo!
E
à Musa respondi como devia:
Que importa, minha Musa, a eterna orgia
Das
Cidades ardentes e gloriosas?...
Se somos seres de almas silenciosas,
Ermas
e sós no seu destino cruento,
Que nos importa o vão deslumbramento
Das
Capitais ruidosas e confusas?...
Se não sentimos, como as outras musas,
No
vinho das volúpias corrompidas
As alegrias das fatais bebidas,
Dos
reserva esta Cidade Humana
De que o senso banal tanto se ufana?...
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