Severino Marcos de Miranda Tavares é
paraibano de Ingá do Bacamarte e foi um dos fundadores do Grupo Sanhauá. Autor
de textos para teatro. Publicou Fuzuê e Finados, Dual dos Incriados, Réquiem
para a Confederação dos Tamoios, Agora o pavão sem mistérios, Notícias de
Jornal, Algumas histórias e outros poemas. O poeta faleceu em 2020.
TRÊS BOLEROS CARDÍACOS Bolero -1
nada que é vidro
é eterno,
blindado
coração de ferro
por que
me atraiçoastes?
não te bastava então
a lima dos meus dentes,
roendo o vai-e-vm
do pranto,
precisavas tanto
de um cristal?
blindado coração!
em que inferno
cosi tua limalha,
essa tralha enorme
de saudade.
bolero 2
a letra A quer dizer amor perfeito. e a letra C, de que coração fala? não fala, cala.
bolero 3
doutor, afine esse diapasão. meu coração anda ultimamente, num ritmo que não quero. devolva-lhe o bolero ou me retire do salão. *****
Por que
me Ufano de
- É um pássaro, um avião?
Não. É Bartolomeu Gusmão
na sua passarola.
Ê um pássaro, um avião?
Não. Ê Santos Dumont
que decola e pede bis
em Paris.
Manuel de Abreu um dia
descobriu que a abreugrafia
lhe mostrava o lado interno
o inferno de Kock
a tortura do bacilo
um três por quatro da tosse.
2.
Nessa terra de porvir
à beira do abismo
a solução é descobrir
o mais pesado que o ar,
ou então vasculhar
a caverna pulmonar
a tísica galopante.
3.
O mundo inteiro garante
que Deus é brasileiro
e que Portugal cabe
inteiro no Piauí.
O melhor está por vir
nessa beira de abismo
quando o país decolar
morrendo de hemoptise
com Santos Dumond no leme
Manuel de Abreu no timão
um auri-verde avião
uma nave interestelar
apontada em direção
dos buracos do pulmão.
4. Uma nave carregada
de imensa sabedoria
bem mais leve que o ar
mais tênue que a abreugrafia
uma película de sangue
uma golfada de ar,
tão interno aeroplano
que decola numa tosse
como nave pulmonar.
*****
lição de pintor – I
deixe que o traço
como tiro
rompa o branco do papel
feche a íris
do olho, arco, mire,
dispare o pincel
feixe de luz, prisma
incompleto. veja
pelo ângulo reto.
*****
natureza morta com casa
não sei
se minhas palavras voarão;
não sei sequer se terão asa.
mas elas estão dentro de mim
como uma casa dentro de outra casa.
não sei
se minhas palavras voarão,
não sei sequer se serão fala
mas, se conversamos
é uma pena.
outras palavras
de outros poemas,
vagam dispersas pela sala.
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