segunda-feira, 27 de fevereiro de 2023

Anna Apolinário

Anna Apolinário nasceu em João Pessoa. É poeta e professora, licenciada em Pedagogia pela UFPB. Entre seus livros publicados, destacamos Zarabatana, Solfejo de Eros e Mistrais. Sua poesia pode ser encontrada em diversas publicações, revistas, sites e blogs de poesia e crítica literária.

 

 


 

 

 

TALHO

 

 

Salamandras no cio

Arranham as ancas de minha esquizoidia

 

Línguas negras de argila

Os hematomas são drusas

Ultrametistas

Verso violáceo metamorfoseado

Na carne de Carmen de Godard

 

Sal, suor, sangue, gritos

Agora eu cheiro a feromônio de raflésia

 

Eis o início de um grande amor:

Carniça

 

 

 

 

 

 

Selvática

 

Morder a polpa da palavra
Violentar o verbo

Açoite
Até que o rubro escoe

Atingir o cerne
Com sabre, punhal

Lacerar o arco e a lira
Alvo metafísico

Colisão cáustica
Matilha sádica

Eu quero o aborto
Da aurora boreal

 

 

BREVIÁRIO

 

 

A nebulosa do poeta passa no precipício do amor

 

Um átomo metamórfico

lacera a íris do universo

Eriça

o espinhaço do abismo

 

Búfalo rutilante

estilhaçando a nuvem arterial

 

 

A Pianista

 

A tua voz de incendiar pássaros
Traça surtos escarlates
Na minha sanidade

Ruflam solos ensolarados
O céu erupciona
Um pecado ruivo
O mar sangra seus diamantes

Felina ametista

Um rugido índigo retine
Nas esporas da angústia

 

Magmáticas Medusas

 

Nas madrugadas frias de julho
os pés nus tateiam a casa em ruínas
a pancada do sangue nas artérias
é quase audível
a loucura é uma pedra espessa
um diamante movediço
rebrilhando
coração eriçado
dentro da escuridão

Um verso de Herberto
vórtice, açoite
no leito ladeado de
abismos
os rostos, espectros
de singular agudeza
a música sobe
estrangula estrelas

Às três da manhã
meu olho esquerdo trepida
em contínuas ondas
de cortisol e adrenalina
as pálpebras cerradas
os pulmões em brasa
o corpo saindo
do centro gravitacional
pernas e quadris tecendo
o terremoto áureo
o desenho dos lábios dela
serpentiforme
língua vândala na vulva
vertendo magma
veias abertas
e os cornos em riste

“Eu prefiro você assim,
Vulcão”

 

Garimpo

 

Que teus lábios busquem sem cessar
em minhas densas e voluptuosas cavernas
o doce luminescente minério
o precioso mel de Vênus nascendo
de um ventre cravejado de beijos

 

Estudo para um Delírio (Mozarteando)

 

Ás cinco horas de uma tarde nua e aprazível
Nas veredas do Ponto de Cem Réis
Cá estou a bebericar de meu café cortês
A garçonete me aparece em andrajos de sereia
Sibila-me o verso, ó peixe onírico!
Nobre gota de céu marejou meu olho infante

É Mozart no passeio público
Interrompe seu tropel místico
E vem ter comigo
Ai de mim que não sou poeta!
Acendeu minha cigarrilha
E me trouxe um Blues muito lascivo.

 

 

 


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