segunda-feira, 27 de fevereiro de 2023

Antônio Mariano

 Antônio Mariano nasceu em João Pessoa onde ainda vive. É formado em Eucação Artística pela UFPB e idealizador do projeto Tome Poesia e Tome Prosa. É um dos fundadores do Clube do Conto da Paraíba. Publicou Guarda-cguvs esquecido, O dia em que comemos Maria Dulce, Sob o amor e o romance Entrevamento.





DIALÉTICA

Aquele homem
me aguarda na esquina
com uma faca

que irá repartir o pão

Costasse ele a esquina,
seria talvez padeiro
resgatando a poesia
que me escapa das mãos




HISTÓRIA UNIVERSAL


Nunca soubemos
amar em pleno voo
como as andorinhas

que no auge do prazer
pairam e se absorvem
no antídoto dos instantes

Então escolhemos
em vez do coito
(viveiro de constelações)


lágrima nos olhos
e um banquete de asas

 

 

O LUAR

O claro no olhar da moça
é um só leitmotiv:

a lua está lua.
Lua como sempre achou-se.

Nua de adjetivos.

 

 

 

EXCEÇÃO À TEORIA

 

Quando se vai amar,
as teorias fora do quarto. 

Como as sandálias
ficam esquecidas à porta do banheiro
senão molham-se ou sujam.

Quando se vai amar,
as teorias são o tapete.

 

 

 

EXISTENCIALISMO

 

Ele faz poesia
porque morre de medo
do tiro
no ouvido.

E esquece
da extrema poeticidade
do suicídio.

Que tolo!

Que é então o poeta
senão um suicida
reincidente?

 

 

 

Construção de miragem

              para Alfredo Bosi

 

Vi,
na outra margem do rio,
uma garça rindo
pra mim.
Em tempo, confirmo: menti.
Entrevi
o que sei dessa imagem esgarçada
no imaginário, rindo
de mim.

 

 

Inconfesso

 

Com o que não te digo
teço um enigma.

o que digo sempre
nega o evidente.

Como essa coragem
de me dizer teu fã;
e esse suave relâmpago
a visitar teu rosto. 

E a visitar o meu, fosco.

 




 

Alquimia do ódio

 

A química de querer-te
sempre viva:

extrair pétalas,
moto-contínuo,
malmequer;

adicionar à fórmula
porções deste grito

(alheia dor que transcende
a essência dos mitos).

 

 

 

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