terça-feira, 28 de fevereiro de 2023

 Aline Cardoso é natural de João Pessoa onde reside. Graduada em Letras e Mestre em Linguística na área de Análise do Discurso, pela UFPB. É poeta e fundou a editora Triluna, visando a publicação de mulheres, principalmente negras. Tem dois livros publicados, A proporção áurea do caos  e Hárpia.

 

 


 

 

VOZ

 

Telúrica-antropofágica
Acherontia atropos
Em voo psíquico-onírico
Mariposa posta
Em teus lábios.

  

 

MOIRAS

 

As moiras vêm à noite,
Montando frísios
Carregam víboras,
Anéis de prata,
Um olho e três destinos.
Coloquem as chaves
Nas fechaduras.

 

 

 

EURÍALE

 

Caí em águas negras
Ontem à noite,
Átrio aço maciço
Penetrando o breu.

Bestas bioluminescentes
Precipitavam-se ronceiras
Farejando os nós
Entre meus seios.

Miose,Petrifiquei papilas e ardis
Avioletando a carne
Densa de cada lábio.

Euríale, transmutei a morte
Em meu chocalho dourado,
Circunscrevi muitos nomes
Em minhas escamas.

 

 

 

 

HERA

 

Vim de outras eras
Erva-daninha-brava,
Urtiga-vermelha,
Saliva sumo de
Comigo-ninguém-pode.

 

 

 

 

PARAPEITO

 

Há um gato
(li)malhado
Ao parapeito
Contemplando
O breu,
Eriça-me
A nuca.

 

 

 

 

FÊNIX

 

A urgência corrói 
Minhas asas,
Pássaro em cinzas,
Reviverei
Em voo limpo

Peito de céu aberto,
Tenho feridas
Ressequidas
Pela fúria com que

Enfrento os dias

 

 

 

 

*****

Procuro teu contato
no sinal vermelho:
vias abertas,
trânsito lento,
pessoas atravancam
automóveis
as células
das palavras
se desintegram
na fumaça,
na saliva,
na liberdade
dos discursos
dissecados.

 

*****

Um dia há de vir
minha hora,
incorpórea,
suplico à lápide:
demore-se
copiosamente

 

*****

Expansiva pantera,
trucido lábios ao som
dos tambores de Hécate.
Harpia, visto a rapina,
bebo o gozo da musa,
êxtase selvagem.
Desejo o orvalho
sangrento
das línguas
incendiárias.

 

*****

Implacável: explodo.
Incorpórea: implodo.
Acolho irrupções cíclicas
ao ventre,
a cada novo evento:
subverto
centros gravitacionais,
saliva volátil
pólvora negra
molotov lírico
língua estopim.

 

*****

Panteriça,
invisto contra
as borboletas de aço
do teu estômago.
Entre um ataque
e outro, dilacero-as
devoro-as, mastigo
com voracidade.
Engulo o sabor metálico
das asas reluzentes,
teus demônios
coagulam-se aos meus.

 

*****

Moira necromante
ante a putrefação –
aparente caos
insignificante
A pupila opaca
incide à luz
que não refrata
A língua
arredia
laça palavras
ao fio umbilical
Pulsante
intermitente
atenta
ao último instante.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Envie poemas, minibio e foto para o e-mail lausiqueira@yahoo.com

Francc Neto

  Minha jornada como poeta começou na adolescência,  publicando poemas em revistas e jornais.  Ao longo dos anos, minha poesia foi reconheci...