quinta-feira, 2 de março de 2023

Daniel Sampaio

 Daniel Sampaio é poeta paraibano natural de João Pessoa e advogado formado pela UFPB. Publicou a plaquete Terror sagrado sob o sol de meio-dia e o livro Poetas em Tempo de pobreza & outros poemas. Sua poesia pode ser encontrada em suplementos e revistas de literatura.




 

 

 

TERROR SAGRADO SOB O SOL DO MEIO-DIA

 

1.

 

draga-me

o dragão

às grades

dos dias

 

agrilhoa-me

os braços

de rugas

e algodão

 

nenhum

grito

nenhum

sismo

 

a so

ga gór

dia à glo

te.

 

2.

 

asfixia

 

p(r)esa

ao peito

 

a

 

(l)

í(ngu)

gne(a)

 

a

 

do dra

gão(!)

 

como

(se)

 

insígnea

 

o

sol.

 

3.

 

o corpo à

forca do asfalto

 

catafalc’

o corp’

abort’o

(o) sol

 

bolor

bolor

 

abrolho so

bre a pele s

ob agulhas

de abelha

 

prenhe

 

o dragão

engole-me

a cidade:

 

.

 

4.

 

é como se

engrenagem

a carne gangrena

de cães aço

a apodrecer

rodovias en

cru

zilhadas escamas

o dragão

a sem sangue

se alimentasse de mim.

 

5.

 

abjeto

 

como

vísceras do dragão

 

&

 

intestino de

asfalto

:

corpautofagia

quando o

 

sol

 

se acid

entre

 

abscessos

 

6.

 

o dragão sombrou

m e as (m) as

 

para

o inferno

 

e caí como o corpo morto cai*.

 

7.

 

infern

o

s  berb

o

 

s  u

o

  ss

o

 

& medul

o

pOrOs

o

 

o

 

med

 

 

DA SÉRIE PERFIS

 

1.

 

O cigarro entre os dedos faz cair

cinzas sobre o prato

alumínio e flexível do almoço do dia.

Mas a fome não dejeta

o desejo do vício.

Ao contrário, ela despeja

uma tensão nos intestinos

do faminto que agora come

com as mãos sujas

de um trago pra lugar nenhum.

 

2.

 

A intenção do tiro

lhe passar as têmporas

adoça o tempo que lhe resta.

 

Sabe ser a vida

o segundo de silêncio

antes da estopa da roupa

ensaguentar-se.

 

Como um Werther, o vinho

entornado sobre a mesa,

risca o dedo para sonar a vida

 

e o doce rumor do nada.

 

 

3.

Espera ao pé do lixo

a vez de ser chamado.

Segura a ficha entre os dedos

polegar e indicador

de traços magros, pele

ressecada e rugosa como

figo seco e estragado.

 

À frente há o espelho

das janelas contra o

rosto de horto e pétalas

em pedaços de calcário.

Mas está em desconforto,

e não percebe o reflexo

do ramalhete de corvos.

 

Sua vez, no entanto,

não será agora. Antes

dele, aquela Senhora.

 

 

 

DA SÉRIE NUTRIÇÃO DA PELE

 

1. Amors es perduda

 

quero

   do Amor

diamante qual

dinami

 

te nitri

dos as

 

ticos

ânsia onça

de roubá-la robusta

 

antes

de tuas car

nes

o belo molde

 par

 

tir,

and being

bent and wrin

kled,

que ao

 

tem

po res

te o des

ate.

 

2. Mudragada

 

pó sobre maráguas                   sob arcada

biombo de estrelas                   serpentes e cambraias

 

o chão e o campo

tudo escuro depois da praia

 

até o satelight              pálpebras sobre o olho

onde só se vê               a pouca lúgrima

 

o pó cobre

tua presença derramando

como óleo

quente

 

                                   já à hora de ir embora

 

3.

 

A porta entreaberta

entrevejo

sob um quarto de luz

sobre a cama

a silhueta

que teu vestido

deixou à vista.

 

O braço branco

por sobre a cabeça

se insinua o sono

de teus cabelos

à sombra do criado mudo.

 

Salivo cada sílaba

no bobo beijo

que o ar me leva.

 

  

 

 




O AMOR EM DOBRAS

no espaço a que nós dois nos damos
as mão que o espanto desperta um corredor
em dobras a dar-se a si seus contornos de dedos o elidir
de sua forma a sua mais prevista como se concha
a fechar-se à pérola que lhe cabe em linhas-lâminas a
eliminar-se as
frestas de suas próprias dobras

 

EVOÉ!

Ela deitada     dilatando
marfim sobre a crina negra
de um cavalo              sua escancarada anca
âncora de suor
o lençol
após galopar                um campo
o algodão


CABÍRIA

a noite sarra a bara de tua saia

a vida são sempre  mambos & mambos pra putas & putas
(menos tu)

e se fosse para sofrer, deixa a queixa
andar pierrô


HOMELESS

meu ninho, o teci-
do d´avenida Epitácio fi
o de pára-choques.
paralele-
pí-
pedos, pedaços de
papel e placas.

 

 

Clotilde Tavares

 Clotilde Tavares nasceu em Campina Grande(Pb) e atualmente vive em Natal(RN). Escritora, dramaturga e pesquisadora, tem mais de trinta títulos publicados, entre livros, peças de teatro e folhetos de cordel. Tem forte presença nas redes sociais, sempre com temas culturais.

 


 

 

**********

Pouco preciso
para ser feliz:
um batom,
uma blusa negra e alguns colares.
Um livro de poemas
aberto em qualquer página.
Um elepê de Piazzola
na vitrola,
e a máxima distância
do eterno replay
dos bares de fim de semana.
O luxo de algumas atitudes insólitas
e um caderno como este
onde escrevo,
diariamente,
bilhetes de suicida.

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QUARENTA ANOS

para Allen Ginsberg

& eu
que uivei como um cão danado pelas esquinas da década de 60
& eu
que me encharquei de drogas & sexo & rock nos inferninhos da década de 70
& eu
que me banho de álcool & solidão nas páginas da década de 80
continuarei sendo aquela poetisa maldita meio beat meio louca
meio rock meio boba & tão necessária quanto uma garrafa vazia
de refrigerante ou um copo de papel usado?

continuarei derramando o meu sexo no asfalto das avenidas
ensopadas de sangue & vidros partidos?

continuarei dividindo o meu rosto nos retrovisores dos táxis
& xerocopiando o meu corpo em cada farmácia de esquina?
& se não tivesse feito tudo isso

& se não fizer tudo isso
vale a pena
ainda
estar viva?

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ZOOM

A bolsa, o traço de lápis,
os óculos e o sapato bicolor,
a aparência dos gestos.

A mão de unhas e dentes
e as frases escritas sem muita fé
na poeira das mesas.

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ITINERÁRIO DA SOLIDÃO

Domestico a angústia,
Corto delicada fatias de solidão para o jantar,
gelo o vinho,
escolho as taças,
acendo as veias.

O meu quarto tem bandeiras.
Caíram todos os vestidos dos cabides.
O gelo derrete.
O telefone tocou: foi engano.

Deixo atrás de mim portas abertas,
tomo táxis,
invado bares,
provo garrafas
e bebo bocas incandescentes
de álcool
e dentes.

Em algum lugar do mundo
espero a madrugada
e meu corpo sangra
duro e tinto
um poema.

De volta à casa
toco de leve os móveis.
Fecho as portas,
leio os classificados,
atraso os relógios.
Alimento a medusa
e para mim frito cebolas.

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PORTRAIT

para Flávio Américo

Quero uma foto minha
como me vejo:
de frente e
absolutamente quieta.
Olhos abertos
e a mão esquerda
tocando de leve a face.
Nos dedos, um cigarro aceso.
E penso.

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WAR GAMES

Antes do combate
a vigília:
fria hora de pensamentos.
Depois
sento no campo de mortos
e me delicio com teu corpo,
teus olhos cegos de peixe.
Para sempre muda a tua boca parva
e teus conceitos filosóficos
profundos como um pires.
Para sempre extinta
tua existência de mosca.
Para sempre calado
teu hálito
gelado
de cigarro
mentolado.

**********

Eu,
que li páginas em branco
que dormi sem lençóis
que pari filhos mortos

eu
cansei.

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CÁLICE

Beba formicida

ou esqueça.

 

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QUEM AMA NÃO MATA?

Eu te amo
muito
no escuro
do quarto
e depois
pergunto
se você
gostou?

 

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DOMINGO À NOITE

Exploro delicadamente
com as pontas dos dedos
tuas costas
nuas.
Impiedosamente
dormes,
enquanto eu,
sozinha e abstêmia
como, com maioneses,
dezessete gols fantásticos.

 

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GOOD MORNING


Mordo o fruto matinal do dia
e deixo o seu sumo
lentamente constranger minha garganta.

Ao sol me entrego
e em seu hálito
me banho,
enquanto o mel da manhã
me perfuma os seios
como rosas à janela
derramando pólen sobre o mundo.

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PAPO DE BAR

Não me provoque.
Sou doida
e quando bebo
fico um porre.
Cai fora.
Estou com sono.
Se você insistir mais
eu me apaixono.

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MULHER SEM PASSADO


Já pensou?
Sentar
na mesa do bar
e não ter nenhuma história
pra contar?

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QUARTO DE CASAL


Melhor quando se tem dois:
um na minha casa,
outra na sua.

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Envie poemas, minibio e foto para o e-mail lausiqueira@yahoo.com

Francc Neto

  Minha jornada como poeta começou na adolescência,  publicando poemas em revistas e jornais.  Ao longo dos anos, minha poesia foi reconheci...