segunda-feira, 27 de fevereiro de 2023

Águia Mendes

 Águia Mendes nasceu em João Pessoa e é frmado em Letras pela UFPB.  Integra a antologia  Cem poetas brasileiros e a Coletânea de Poetas do Nordeste Brasileiro. Publicou Nlues para um cadáver sonhador, Sol de algibeira, Jardim de Inf^ncia, Asa de Cigarro, entre outros.

 


 

BAR NOTURNO


a noite
está lá fora
bêbada

falando alto

dizendo
palavrões

mas as lâmpadas
nem ligam

 

 

DOMINGO À TARDE


todo mês
verinha
quer descanso

escreve
na calcinha:

fechado
para balanço



A casa

 

                   A gustavo fernandes de lima sobrinho

 

Há quatrocentos anos

eu sonho

uma casa no mundo

varanda dos lados

wc com luar

ruas refulgentes

poltronas & sofás.

 

há quatrocentos anos

eu sonho

uma casa marítima

alcova com beira-mar

padarias & jardins

vulva crepuscular

 

casa que é bar

vulgata vulgívaga

retreta lunar.

 

mercearia

com pomares em órbita

e sonoros pardais

ou um negro coagido

por uma confederação

de poetas marginais

 

há quatrocentos anos

eu sonho

 

uma casa em desvario    

sala de estar com sol poente

zoológicos & rios.

 

terraços com auroras boreais

um porsche movido

a sonho

cocas & guaranás.

 

casa que é mundo

rolando em mar profundo

casa que é casa

com uma manhã cada manhã

nascendo no ar na selva

casa trágica onde habitam

feras intramuros.

 

há quatrocentos anos

eu sonho

Um home sweet home

londres paris

montanhas carnavais

boulevards colibris.

 

há quatrocentos anos

eu sonho

uma casa erigida

sobre a areia do sonho.

 

 

Morrer

 

morrer

é apagarem-se

todas as luzes da casa,

 

quando tudo gela

na noite

maravilhosa e bela

e o céu se infesta

de estrelas

e faz um

silêncio de rachar.

 

morrer

é não mais

ir à feira.

 

é ficar em casa

descansando

em trajes

de madeira.

 

 

 

Poema da vagina

 

a vagina

é um bolso

um calabouço

um poço no jardim.

 

a caixa de Pandora

a lâmpada de Aladim

que homens adoram

e mulheres que não

e que sim.

 

a vagina é uma chama

uma chaminé 

o chapéu do pênis

o tênis do seu pé.

 

a boca de um jacaré

sem dentes

um galpão

uma gruta

um grotão

um cano de passar

gente.

 

a vagina

é uma mala

uma maleta

um vale

uma valise

uma valeta.

 

um cone

um canal

um monte

uma fonte

um horizonte

vertical.

 

a vagina

é uma boca

com gula

um forno

uma fornalha

uma fagulha.

 

Um viaduto

um aqueduto

um bornal

a caixinha de rapé

para o nariz do pau.

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2023

Dira Vieira

 Dira Vieira nasceu em João Pessoa onde ainda reside. É poeta, jornalista e professora. Mestre e Doutora em Sociologia. Foi integrante do grupo Oficina Literária nos anos 80. É avó de quatro.





De olhos fechados

 

Não sei falar com os olhos, 
nem as minhas mãos cantam como as palavras.
O que me resta é a letra, 
caderno antigo de caligrafia
e o desejo procurando morada.



Dominical

é a tua boca
gomo matinal
que me chama
pelos nomes secretos

nunca boca mais linda
me quis tão de perto.



Fuga

abriu minha blusa
e escondeu-se do mundo.

era só o meio do dia
e o que mais queria

era ser poesia
na boca da noite.




sacrificial

no primeiro golpe
ele me beijou.

no segundo,
ele se foi.

desde o começo
eu sabia
que um abismo chama outro.

amar
é 
premeditar 
a pena
e o enforcamento





quarta-feira, 15 de fevereiro de 2023

Antônio Aurélio Cassiano

 Antônio Aurélio Cassiano é poeta e formou-se em História pela UFPB. Nasceu e vive em Triunfo, no Sertão da Paraíba.Ao longo da vida, desde adolescência, sempre escreveu poemas e textos reflexivos, resenhas e artigos  que abordam a história e os principais aspectos culturais do município de Triunfo. Noano 2000 publicou seu primeiro livro  de poemas, "Sobre memória e solidão". Depois publicou Memorando 42. recentemente publicou Poemas Embalados a vácuos, pela Editora Arribaçã.

 

 




 

****

 

Haverá a hora

A última

A derradeira

Haverá o recomeço

O tempo do tempo

A revelação

Haverá a escuridão

Luz no tempo

Das coisas

Dores mortas

E os códigos

Serão renovados

A História vai começar de novo

Não tem mais tempo

Só passagem

E o passarinho lentamente alça voo

 

 

****

 

 

Porteiras

Tramelas

Agô

Porque a parte

De mim que deságua

É Oxum

A parte que

Reza

Oxalá

A que planta

E que colhe

Ossain

O caçador de mim

Mil tons

De Oxóssi

E no mar

Filho peixe

De Yemanjá

Para as injustiças

Eu tenho o duplo

Machado

As correntes rompidas

Chicote em açoite

As saias de Oya

E do ferro ergue-se

Os caminhos do saber

E a guerra das manhãs

Nós irmãos

Iberês

E a doçura do afeto

Ewa

O ciúme

E a orelha

A beleza

Escondida

Pipocas Atotô vida

E o filho do rio

Com o caçador

Reluz na manhã dourada

O arco-íris

A cobra

O disfarce

Obá

Espada

Despida

E por fim

A lama

Mãe de todos nós

 

 

 

****

 


Quando eu for morrer

Tudo que quero

É uma cama

Uma dor

Uma mão segurando

A minha mão

Um vela de cera

Uma excelência

Cantada como

Um rock'n'roll

E as dobras do tempo

Me espalhando pelo chão

Quando eu for morrer

Gostaria de estar

Sorrindo

Mas morrer dói

Como

Nascer

 

 

****

 

Tenho a dor como

Companheira

Mas a alegria

Como profissão de fé

Tenho o amanhã

Como possibilidade

E a eternidade

Como devaneio

Deus

Sou eu

Ele

É o meu desejo de salvação

Não sei de quê

 

 

****

 

 

Como a cor do tempo

Tinge as portas

As janelas

As paredes

As casas

E quem mora nelas?

Como o tempo

Tinge

As aparências

Para esconder

Sob o zinabre que oxida

Histórias?

O tempo envelopa

Suas presas

Para que um dia

As que resistirem

Se revelem

E abram as janelas do passado

E nós

Que no futuro

Também seremos passado

Olharemos para o monte onde moram

Os Deuses

E que se ergue em nós?

Nós

Espalhados

No tempo

Como poeira

De estrelas

 

 

****

 

 

No mais das vezes

Somos as sobras

De nós mesmos

E de tão pouco a cada dia

A cada dia

Nos tornamos mais raros

Somos as águas

De um rio largo

Que arrastou barrancos

Dragou barcos

Mas deixou para traz as pedras

E os caminhos que não pode levar

Nós nos alongamos

No tempo e

Ao mesmo tempo

Estreitamos nossas margens

Até nos tornarmos um fio d'água

Um pingo

Um pingo que

O calor do sol

Vai fazer evaporar...

 

 

****

 

Nasci dos galhos

De uma frondosa

Mangueira

Meu sangue guarda

A cor das misturas

Ibéricas

Dos árabes

Conquistadores

Das dores que pariram Portugal

Sou sobra dos disfarces

Que esconderam os judeus

Da sanha da inquisição

Sou cristão novo

Misturado a índio Icó

Sou brasileiro negro

Eu sou filho

De muitos Deuses

Vindos de terras distantes

E nascidos no quintal do meu avô

 

Marcos Tavares

Severino Marcos de Miranda Tavares é paraibano de Ingá do Bacamarte e foi um dos fundadores do Grupo Sanhauá. Autor de textos para teatro. Publicou Fuzuê e Finados, Dual dos Incriados, Réquiem para a Confederação dos Tamoios, Agora o pavão sem mistérios, Notícias de Jornal, Algumas histórias e outros poemas. O poeta faleceu em 2020.





a moça em alto contraste


I
jogou seus sonhos de amor
no barco de um marujo
naufragado
perdeu,
a virgindade e o seu lugar
no álbum.
meu tio arrancou o seu retrato
e escondeu, sob o bigode, o riso.
há uma página vazia
no álbum e na lembrança
um medo imortal
que dança
um can can sobre a memória.
2
honrava pai e mãe até o dia
que o marinheiro atracou no seu
porto.
o velho quase morre
de desgosto
mas a moça detestava
a calmaria.
desenrolou as velas e partiu
dançando um fox trote.
arrancou a âncora do útero
e navegou em direção à vida.
3
ficou no cais
esperando o navio
mas foi o tempo
quem passou
içou as velas do leito;
e a noite, audazes marinheiros
lhe abriam a quilha
fez água
e naufragou um dia
com os porões cheios
de mágoas. *****



TRÊS BOLEROS CARDÍACOS Bolero -1


nada que é vidro é eterno, blindado coração de ferro por que me atraiçoastes? não te bastava então a lima dos meus dentes, roendo o vai-e-vm do pranto, precisavas tanto de um cristal? blindado coração! em que inferno cosi tua limalha, essa tralha enorme de saudade.

bolero 2


a letra A quer dizer amor perfeito. e a letra C, de que coração fala? não fala, cala.



bolero 3


doutor, afine esse diapasão. meu coração anda ultimamente, num ritmo que não quero. devolva-lhe o bolero ou me retire do salão. *****




Por que

me Ufano de  

 

  1. É um pássaro, um avião?
    Não. É Bartolomeu Gusmão
    na sua passarola. 

Ê um pássaro, um avião?
Não. Ê Santos Dumont
que decola e pede bis
em Paris.

 

Manuel de Abreu um dia

descobriu que a abreugrafia

lhe mostrava o lado interno

o inferno de Kock

a tortura do bacilo

um três por quatro da tosse.

 

2.      Nessa terra de porvir
à beira do abismo

a solução é descobrir
o mais pesado que o ar,
ou então vasculhar
a caverna pulmonar
a tísica galopante.

 

3.      O mundo inteiro garante
que Deus é brasileiro

e que Portugal cabe
inteiro no Piauí.

 

O melhor está por vir
nessa beira de abismo
quando o país decolar
morrendo de hemoptise
com Santos Dumond no leme
Manuel de Abreu no timão

 

um auri-verde avião
uma nave interestelar
apontada em direção
dos buracos do pulmão.

 

 4. Uma nave carregada
de imensa sabedoria
bem mais leve que o ar
mais tênue que a abreugrafia

uma película de sangue
uma golfada de ar,
tão interno aeroplano
que decola numa tosse
como nave pulmonar.




*****

 

 


 

lição de pintor – I

deixe que o traço
como tiro
rompa o branco do papel

feche a íris
do olho, arco, mire,
dispare o pincel

feixe de luz, prisma
incompleto.  veja
pelo ângulo reto.




*****




natureza morta com casa

não sei
se minhas palavras voarão;
não sei sequer se terão asa.
mas elas estão dentro de mim
como uma casa dentro de outra casa.


não sei
se minhas palavras voarão,
não sei sequer se serão fala


mas, se conversamos
é uma pena.
outras palavras
de outros poemas,
vagam dispersas pela sala.

Envie poemas, minibio e foto para o e-mail lausiqueira@yahoo.com

Francc Neto

  Minha jornada como poeta começou na adolescência,  publicando poemas em revistas e jornais.  Ao longo dos anos, minha poesia foi reconheci...